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A necessidade de propositura de um projeto de lei que garanta os direitos da população LGBTQIA+ privada de liberdade foi defendida no Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) nesta quarta-feira (19/2). Pareceres aprovados pelo plenário da entidade sugerem que a resolução conjunta CNPCP/CNLGBTQIA+ nº 2/24, que estabelece parâmetros para o acolhimento desse público nas prisões, seja transformada em matéria legislativa. Segundo as análises, por se tratar de uma norma técnica, a resolução carece de coercitividade e pode ser entendida por magistrados como mera recomendação.
A posição foi defendida pelo desembargador João Marcos Buch, que fez a relatoria da matéria pelas Comissões de Direito Penal e de Criminologia, e pela advogada Laura Berquó, relatora pela Comissão de Direitos Humanos. Além de determinar a criação de alas e celas de convívio LGBTQIA+ nas unidades penitenciárias, a resolução ainda trata da autodeclaração de identidade de gênero da pessoa custodiada, garante o direito ao nome social no sistema penitenciário e a integridade da intimidade com relação às revistas íntimas vexatórias de visitantes e das próprias pessoas presas.
Laura Berquó destacou que a norma está em conformidade com os princípios defendidos pela Constituição Federal de 1988 e pelos tratados internacionais de Direitos Humanos em vigor no ordenamento jurídico brasileiro, bem como com a legislação civil que trata dos direitos da personalidade. No entanto, a advogada disse que há necessidade de se garantir que a matéria ganhe o status de norma jurídica, o que só poderia ser feito através da alteração do Código de Processo Penal e demais leis específicas. “A garantia da aplicação da referida resolução se justifica por outros instrumentos legais, e não por ela em si”, sublinhou.
João Marcos Buch explicou que, ainda que essa resolução seja oriunda de conselhos de políticas públicas, há um grande debate jurídico sobre a coercitividade de resoluções dessa natureza. Assim, a determinação sobre a colheita da autodeclaração pelo magistrado em audiência, por exemplo, pode não ser cumprida como garantia. “O Poder Judiciário é independente e somente por meio de lei é que haveria uma obrigação ao juiz de agir conforme a resolução indica. Em razão da ausência de coercitividade, as disposições da norma-técnica poderiam sofrer resistência quanto à sua aplicação por parte dos magistrados”, disse o relator.
O desembargador também sugeriu que, na intenção de proteger os direitos da população LGBTQIA+ privada de liberdade, seja criada uma “comissão executiva para fiscalizar a implementação do disposto na resolução, por parte do Ministério da Justiça e do Conselho Nacional de Justiça”. Além disso, ele defendeu a criação de um programa de qualificação de todos os trabalhadores do sistema de Justiça criminal e penitenciário, dentre eles, juízes, servidores, promotores, defensores, policiais e equipes técnicas envolvidas na implementação das medidas em questão. Segundo Buch, também há a necessidade de fortalecer a aplicação de medidas como a prisão domiciliar para a população LGBTQIA+ e discutir políticas públicas para redução do encarceramento no País.
A indicação que deu origem aos pareceres foi feita pela presidente da Comissão de Criminologia, Marcia Dinis. Ela elogiou o posicionamento dos relatores e reiterou a necessidade de a matéria ser incorporada na legislação nacional: “Precisamos que essa norma se transforme em uma lei, para que se tenha a efetividade que não é dada a uma resolução”.
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